domingo, 10 de outubro de 2010

Armadilha de Areia




Certa manhã de sábado, há muitos anos, eu e meus irmãos estávamos
correndo pela casa, querendo terminar o mais cedo possível nossas
tarefas domésticas. Estávamos animados porque nosso pai havia prometido
levar a família para passear na caminhonete usada que compráramos
recentemente. O carro já tinha cinco anos, e queríamos um mais
novo, mas nosso pai disse que seria caro demais. Além disso, garantiu
que o carro que comprara era mais pesado e seria mais seguro em caso
de acidente. Esse era um fator preponderante para minha mãe, que
pouco antes se envolvera numa terrível colisão frontal e quase morrera.
Quando terminamos de preparar tudo, todos entramos no automóvel:
minha mãe, meu pai e os sete filhos, inclusive um bebê. Como era sábado
à tarde, não levamos comida nem nada para beber.
Fomos até a rodovia e seguimos rumo ao norte. Fazia muito calor, e não
tínhamos ar-condicionado. A paisagem à nossa volta era o deserto árido
e ermo com plantas xerófitas, algumas poucas formações rochosas e alguns
postes de telefone e morros baixos ao longe, na linha do horizonte.
Apesar da temperatura escaldante e do cenário inóspito, estávamos felizes
por fazer um divertido passeio familiar. Contudo, o clima de felicidade foi
interrompido pelos protestos da minha mãe. As lembranças do acidente
que sofrera ainda estavam bem vívidas e a visão dos carros que passavam
por nós deixava-a muito assustada. Por causa dele, meu pai
resolveu sair da autopista. “Aqui estamos”, disse ele com alegria ao entrar
numa estrada de terra margeada por uma fileira interminável de linhas
de transmissão. Levantando uma nuvem de poeira, o carro saiu tinindo
pela velha estrada. Eu, que na época tinha treze anos de idade, estava
adorando aquilo tudo.
Tão entretidos que estávamos, eu e meus irmãos nem nos demos conta
do olhar de preocupação de nosso pai. Mas nossa mãe sabia que havia
algo de errado. “O que há, Anthony?” indagou ela.
“Bem”, ele respondeu, “talvez não seja nada, mas a areia lá na
frente parece-me perigosa. Acho melhor voltarmos.” Logo depois,
achou um local largo o bastante no alto de um pequeno morro e deu
meia volta. niciamos o trajeto de volta descendo a ladeira e subimos o
 morro seguinte, e o que meu pai temia aconteceu. O carro afundou na areia
macia. Quase todos nós saímos do carro e empurramos com toda a força,
mas não foi possível fazê-lo avançar. Conseguimos empurrá-lo de
volta para uma parte mais sólida do terreno para que adquirisse impulso
antes de passar pelo trecho arenoso.
No entanto, as várias tentativas fracassaram, principalmente porque ele
precisava ter cuidado para não voltar demais e cair em outro trecho de
areia. Após cada tentativa, o carro ia um pouco mais para frente, mas em
seguida afundava ainda mais na areia fofa e traiçoeira.
As crianças menores começaram
a chorar. “Estamos com sede, mãe.”
Sob o quente sol vespertino, víamos ondas de calor subindo da areia,
ofuscando a visão das montanhas no horizonte.
Então, ouvimos ao longe um som débil vindo em nossa direção. O
zumbido de um avião monomotor ficou cada vez mais alto à medida
que se aproximava. “Ah, é a nossa salvação!” Chorei ao ver o avião.
“Vamos todos acenar para que ele
aterrisse!” Agitamos os braços freneticamente.
Era o avião que inspecionava as linhas de transmissão. O
piloto estava voando tão baixo que conseguíamos vê-lo inclinando-se
em direção à janela. Ele estava voltando, também acenando para nós
simpaticamente, achando que estávamos apenas cumprimentando-o.
Quando o avião se distanciou e o ruído do motor enfraqueceu, sabíamos
que estávamos entregues à própria sorte.
A situação estava ficando desesperadora.
Não tínhamos comida nem água, minha mãe estava tentando
acalmar o bebê, que a essa altura já estava histérico, as quatro meninas
estavam chorando e até meu irmão e eu começamos a duvidar de
nossas chances de voltar para casa em segurança.
Nosso pai reuniu a família e anunciou:
“Só nos resta fazer uma coisa.
Vamos pedir auxílio ao Pai Celestial”. Todos nos ajoelhamos na
areia abrasadora e inclinamos a cabeça
enquanto nosso pai suplicou com todo o coração em favor de
todos nós. Explicou nossa situação ao Senhor com pormenores, inclusive
todas as coisas que fizéramos para sair dali. Em seguida, implorou ajuda.
Após a oração, levantamo-nos e nosso pai disse: “Vamos tentar de novo”.
Pediu que ficássemos fora do carro enquanto retrocedia para mais
uma arrancada. O motor rugiu quando nosso pai deu a partida o mais rápido
que podia. O carro chegou ao trecho arenoso, mas dessa vez continuou
em movimento, como se estivesse flutuando. Nosso pai foi até o
alto do morro seguinte e parou num terreno sólido e rochoso. Todos
aplaudimos e corremos até a caminhonete.
Quando chegamos lá, nosso pai estava sentado ao volante, tremendo
e soluçando, algo que eu nunca o vira fazer antes. Quando lhe perguntamos
qual era o problema, ele levantou os olhos e disse que parecia
que o carro havia sido erguido e carregado por sobre a areia por um
poder invisível.
Voltamos para casa sem novos percalços, contemplando os tons 
alaranjados do sol poente no céu do oeste. Ninguém disse palavra, como
que para não desfazer a atmosfera reverente que reinava no carro.
Embora eu saiba que as respostas às orações venham de diversas formas 
e nem sempre cheguem de maneira extraordinária, sou grato ao Pai
Celestial pelas bênçãos daquele dia.
Gary M. Johnson é membro da Ala Needles,
Estaca Lake Havasu City Arizona
A Liahona Mar 2001

Nenhum comentário:

Postar um comentário